sábado, 8 de setembro de 2012

Cheiro de Nostalgia

Casa Renascença
Mozart Jardim Paulino


   A Casa Renascença era para mim, ainda criança, o estabelecimento comercial mais fascinante de
toda Casa Branca. Não se tratava de uma loja qualquer, ali a gente encontrava brinquedos, livros, revistas,    material escolar, material de escritório e muito, muito mais. Era uma loja para qualquer época do ano. No inicio de cada ano letivo comprávamos todo o material escolar lá. E ao final dos idos novembros e dezembros eu me maravilhava com os enfeites natalinos Sem estar cônscio disso, o Sr. Natal,  o proprietário da loja, por anos e anos fez crianças sonharem.
 
Como eu, quantas e quantas crianças, na época, devam ter encontrado na Casa Renascença um tipo de refúgio, onde a realidade se tornava mais leve.Brinquedos da Estrela, Atma, jogos, quebra-cabeças, quanta coisa ali nos fascinavam. Sempre tive muitos brinquedos, muitos jogos, muitos livros de estórias, a maioria, sempre comprados na Casa Renascença. Mas era-me extremamente proibido ler revistas em quadrinhos e colecionar figurinhas. Por quê? Alegava minha mãe que as revistas em quadrinhos traziam um português péssimo, além de erros gramaticais graves e ainda por cima, viciavam o leitor naquele tipo de leitura. Assim sendo, posteriormente a criança que lia as revistas em quadrinhos não iria adaptar-se a leitura de livros que não trouxessem ilustrações.E assim, eu era obrigado a ler trechos de livros que, me pareciam tenebrosos, pois não me despertavam o menor interesse, tendo que resumi-los após a leitura e apresentar o resumo à apreciação da minha mãe.
  Eu vivia negros e pesados anos de tirania total. Isso era proibido. Aquilo não era bom.Não me era permitido colecionar figurinhas, pois também viciavam. E assim tantas coisas que são naturais para uma criança na infância e meninice me foram tolhidas.

Naquela época, em plenos anos 60, revistas em quadrinhos, também conhecidos por gibis, fervilhavam entre a criançada. Eram revistas da Disney como O Pato Donald, Zé Carioca, Mickey e Tio Patinhas. Eram revistas de Hanna-Barbera como Os Flintstones, Os Jetsons, Zé Colméia, dentre tantas outras, como Tom & Jerry, etc...Eu era fascinado pelas revistas da Disney. Porém se aparecesse em casa com uma revista em quadrinhos “pagaria” um alto preço por aquilo,além de ter a revista confiscada e queimada. Fazer o que? Uma criança contra a todo-poderosa mãe...
 
Minha tia! Minha tia amenizava tudo. Disse-me que poderia comprar as revistas que quisesse na Casa Renascença, marcando-as em sua conta. Perfeito! Comprava as revistas. Marcava-as na conta da minha tia. E a minha tia ainda as guardava para mim. Fim das fogueiras de gibis, fim das surras injustas e inúteis por causa tão insignificante.E começava uma nova era para mim: tornei-me freqüentador assíduo da Casa Renascença.

Da rua, ao lado esquerdo do estabelecimento, parava por longos minutos a observar as revistas expostas num grande mostrador. Não eram só revistas infantis, mas também via-se lá O Cruzeiro, Realidade, Grande Hotel, Placar, Seleções e tantas outras cujos nomes me fogem à memória agora. Creio que muita gente da época ainda se lembra disso. Depois adentrava a loja e saia com vários exemplares das revistas que mais me interessavam.  

Ao final dos anos 60 a Editora Abril começou a publicar várias coleções em fascículos que, mais tarde encadernados formavam interessantes coleções de livros: Enciclopédia Abril, Geografia Ilustrada, Grandes Vultos da Nossa História, etc...Tudo isso encontrava-se na Casa Renascença. E assim foi por anos. Coleções de fascículos que eram acompanhados por LPs de 22 polegadas, trazendo os grandes compositores da música clássica, e também da MPB. E assim eu ia adentrando aquele mundo que a cada dia se me tornava mais fascinante.
 
Não posso deixar de mencionar os álbuns de figurinhas que, as escondidas, eu comprava e colecionava. Bicholândia, Dom Pixote, Zé Colméia e os Flintstones, Flipper, Perdidos no Espaço, sem mencionar tantos outros, foram alguns álbuns que marcaram a minha infância. A gente chegava a bater à casa do Sr. Natal, nos domingos à tarde, para que nos vendesse figurinhas. Crianças...

Em meados dos anos 70 o Sr. Natal comentou estar já muito cansado. Assim sendo, deixou de vendar revistas e outros materiais a fins. Continuaria apenas com a venda de brinquedos, material escolar e de escritório. Mais tarde vendeu a loja que, ainda por anos, continuou a ser a Casa Renascença, muito mudada, mas ainda conservando o nome. Nessa época eu já era um jovem e aquele estabelecimento já não mais tinha para mim a importância de outrora.
Bons tempos foram aqueles... Digo bons tempos em termos, pois não tenho a menor saudade do terror que vivi. Porém devo reconhecer que a Casa Renascença, por anos, me foi um refúgio, um local de sonhos, fez parte intensa da minha vida de criança.Sr. Natal, Dona Dalva, sua esposa, que saudade imensa me deixou essas pessoas que partiram no mais leve silêncio, sem saber do quanto me foram importantes um dia.







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